O pacote de ajuste fiscal anunciado pelo governo federal nesta quinta-feira (28) tem causado preocupação entre especialistas e organizações voltadas à educação. Com um corte de R$ 42,3 bilhões no orçamento do Ministério da Educação nos próximos cinco anos, uma das principais promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva — a expansão do ensino em tempo integral — pode estar em risco.
De acordo com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a proposta transfere para estados e municípios uma responsabilidade significativa pela manutenção e ampliação do ensino integral, desconsiderando as limitações financeiras de muitas localidades. "Há municípios que dependem quase exclusivamente de recursos do Fundeb e outros repasses para manterem suas escolas funcionando. Agora, terão que arcar também com o custo do ensino integral, o que pode aprofundar as desigualdades regionais na educação", alerta a ONG.
Atualmente, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) é composto, em sua maioria, por recursos de estados, municípios e do Distrito Federal. A União responde por 19% desse montante, percentual que será ampliado para 23% até 2026. No entanto, o governo federal pretende destinar 20% dessa complementação para o ensino integral, enquanto o restante dos recursos pode ser remanejado para outras ações educacionais ou até para áreas fora da educação.
Especialistas apontam que essa medida reduz a previsibilidade e a garantia de investimentos no ensino integral, prejudicando diretamente a expansão desse modelo. "O ensino em tempo integral é uma ferramenta poderosa para reduzir desigualdades educacionais, mas exige investimentos consistentes. Cortes dessa magnitude colocam em xeque toda a estratégia prometida pelo governo federal", afirma um analista educacional.
A situação é especialmente preocupante para regiões com menor capacidade de arrecadação, que dependem fortemente de repasses federais para oferecer educação básica de qualidade. Sem recursos suficientes, essas localidades podem ver o ensino integral se tornar inviável, ampliando as desigualdades entre estados e municípios.
O Inesc enfatiza que muitos municípios enfrentam dificuldades até mesmo para pagar o piso salarial dos professores. "Se não conseguem cumprir o básico, como irão expandir o ensino integral?", questiona a entidade.
O pacote de ajustes ainda será submetido ao Congresso Nacional, onde poderá sofrer alterações. Apesar disso, o clima de incerteza já gera apreensão entre gestores educacionais e organizações do setor, que esperam maior clareza e compromisso do governo com a educação pública.
A retirada de recursos da educação vai na contramão do discurso de campanha de Lula, que prometeu fazer da educação uma prioridade estratégica para o desenvolvimento do país. "Sem investimento robusto, o ensino integral corre o risco de se tornar uma promessa vazia, prejudicando milhões de estudantes que mais precisam desse modelo de ensino", conclui o especialista.
A discussão sobre o destino dos recursos educacionais promete ser um dos pontos mais sensíveis da agenda legislativa nas próximas semanas. Enquanto isso, a educação brasileira aguarda com incerteza os rumos que o governo federal irá tomar.